ATENAS, Grécia – Na última noite de campanha antes do referendo do próximo domingo, centenas de milhares de gregos saíram às ruas de Atenas para gritar ‘Sim’ ou ‘Não’. Tsipras repetiu que o voto pelo ‘Não’ é um voto para “viver em dignidade dentro da União Europeia”, e os apoiantes do ‘Sim’ insistiram que um resultado negativo põe a Grécia de fora da Zona Euro.
No palco do comício pelo ‘Sim’ há dois ecrãs gigantes que ampliam os rostos daqueles que discursam para a multidão, essencialmente composta por pessoas de meia-idade e jovens adultos. Na avenida do Estado Olímpico, empresários, políticos e figuras mediáticas discursam sobre as consequências negativas da saída da Grécia da Zona Euro e da União Europeia. Um pai de família sobe ao palco para dizer: “O meu filho é autista. Se a Grécia sair do euro, não poderei continuar a comprar-lhe a medicação. A Grécia tem de ficar na Zona Euro para que todos possam encontrar os seus remédios”, diz. Dezenas de milhares de pessoas gritam ‘Sim’, aplaudem e agitam enormes bandeiras azuis e brancas e azuis com estrelas douradas. Todas usam os mesmos autocolantes e cartazes coloridos com a palavra ‘Nai’ (Sim, em grego). Uma mulher limpa as lágrimas,emocionada com o discurso.
Orestis, 30, artista visual, diz à VISÃO que veio ao comício desta sexta-feira porque quer que “a Grécia continue a ser um país europeu”. Está preocupado com o resultado do referendo de domingo porque acha que será 50/50. “As pessoas na Grécia estão muito divididas”, lamenta. “Isto vai ser um grande problema”. Entre os apoiantes do ‘Sim’ encontramos uma antiga ministra grega, Fani Palli-Petralia , responsável pela pasta do Emprego e da Proteção Social em 2007, Governo do Nova Democracia. Fani Palli-Petralia não acha que a divisão do povo grego seja um problema porque é temporária: “Eles querem dividir-nos, mas não vão conseguir. Temos de convencer todos os gregos a votar pelo ‘Sim’ e amanhã trabalharemos juntos”, diz à VISÃO. Depois, acrescenta que segue a situação em Portugal e que deseja que a Grécia faça reformas semelhantes. A manifestação pelo ‘Sim’ ficou circunscrita à zona do Estádio Olímpico, o que facilita a deslocação até à praça Sintagma, onde os apoiantes do ‘Não’ esperam pelo discurso de Alexis Tsipras. Pelo caminho, ouvimos um homem visivelmente irritado gritar ao telemóvel:
“Eu não gosto do euro!!! É assim tão difícil perceber isto?”. Junto ao Parlamento, há gregos que se equilibram no topo das paragens de autocarros. A circulação pela praça é difícil porque há muitos manifestantes no centro e nas avenidas em redor do Parlamento. Há menos bandeiras e cartazes deste lado. Jovens, adultos e idosos transportam pequenos folhetos com a palavra ‘Oxi’ (Não). Um homem mais velho escreveu num desses papéis: “Não ao desemprego jovem!”.
Alexis Tsipras sobe ao palco para dizer aos gregos que escolham “viver em dignidade dentro da Europa e dentro do euro”. Depois, ataca os líderes europeus, dizendo que estes não podem “ameaçar dividir a Europa”. A multidão grita ‘Bravo’ e ‘Oxi’ e bate palmas. A última mensagem do primeiro-ministro é contra a polarização da sociedade: “Na segunda-feira temos de trabalhar juntos para criar um melhor futuro”. Maria, 34, vai votar ‘Oxi’ no próximo domingo. Esta economista pensa que tal voto não implica a saída da Grécia da Zona Euro, mas defende que essa seria a melhor solução. “Deixar o euro é a única esperança para nós. O problema não é económico, é político. A conversa da dívida é apenas uma arma para controlar o povo. As pessoas deviam abrir os olhos e perceber que os mercados estão a decidir as nossas vidas. Isto não é justo”, diz. Taikis Ahtypis, 58, pede para ser entrevistado pela VISÃO. É um apoiantes do ‘Sim’, mas quis “espreitar” o comício do lado oposto. Defende que o referendo de domingo é “ridículo” porque não se pode deixar uma “decisão tão importante” nas mãos do povo. Além disso, Taikis Ahtypis critica as particularidades desta votação. Sabe-se, por exemplo, que, ao contrário de outras votações, o ‘Não’ vai aparecer em primeiro lugar nos boletins de voto. A pergunta colocada no boletim é complexa e inclui vários termos técnicos em inglês (traduzidos em grego entre parêntesis), o que, temem alguns, possa dificultar a compreensão por parte dos votantes.
Depois de Tsipras discursar, é a vez de Sokratis Malamas, um dos cantores gregos mais populares, tomar o palco e aparecer nos ecrãs gigantes instalados na Sintagma. O comício transforma-se em concerto. Todos sabem as letras de cor e cantam, enquanto tentam avançar numa praça Sintagma a rebentar pelas costuras. Junto ao ministério das Finanças, a VISÃO fala com duas mulheres apoiantes do ‘Não’. Theodora Dimitrakopoulous, 40, é professora de Estatística na Universidade de Atenas, e diz-nos que “todos os gregos devem votar ‘Não’ porque, nos últimos anos, a austeridade destruiu a economia, fazendo subir o desemprego, o número de suicídios e a fome.”
Theodora Dimitrakopoulous defende que aquilo que está a acontecer na Grécia é uma estratégia para fazer do país “um exemplo, para que os outros países do sul não se revoltem”. Quando lhe perguntamos o que vai fazer se os bancos não abrirem segunda-feira, Theodora Dimitrakapoulous para para pensar e olha para a familiar, Giorgia Dimitrakapoulous, 38 anos, professora do ensino primário, que hesita por poucos segundos, mas acaba por responder na vez dela. Giorgia olha-nos com intensidade e diz, determinada: “Passaremos fome como os outros gregos. Passaremos fome juntos. Mas estaremos de pé.”